sábado, 29 de agosto de 2009

Poemas com a letra I




                   IDEAL

Menina e moça, a primavera em flor,
Um jardim de esperanças e de sonhos:
Dois olhos como o céu puros: dois sonhos
Polvilhados de risos e de amor.

Tem a meiguice da ave mansa; doce
É sua fala: o olhar uma açucena;
Alma de flor: de lírio, de açucena
Qual se de lírio ou de açucena fosse...

Menina e moça, o riso perfumado
Casto e lirial da primavera em flor,
Riso de anjo; olhar de anjo, alma de flor...
E, um sonho em riso entreaberto, iriado.

Brotam-lhe os seios, cria formas, nasce,
Vai para a vida, tão mimosa e meiga.
Franzina e airosa, é tão mimosa e meiga
Inda com as cores virginais na face!

Amo-a! Sonho de artista, eu a procuro
Extasiado em muda adoração!
Em minha muda e longa adoração
Adoro-a como o ideal de meu futuro!

                *  *  *


  INQUISIÇAO MATERNA

Não sai jamais de ao pé da mãe.
A passear não sai também,
         Não pode rir!
Pobre criança, pobre menina!
Seu coração, como a bonina,
Procura a noite para se abrir.

Seus grandes olhos tristes e vagos,
Como dois sóis sobre dois lagos,
         Cheios de pranto...
Triste, serena e resignada,
Ó pobre freira enclausurada
Por que razão padeces tanto?

Amas e sofres silenciosa
A dor ingrata e tenebrosa
         Que te lancina.
Ó desventura inda não vista!
–De uma alma a flor pisada a vista!
Pobre menina, pobre menina!

Como de um ramo tombam as flores
Despetaladas pelos ardores
          Do sol vibrante,
Essa grinalda de fantasias,
Feita de sonhos e de utopias,
Vês-la murchar de instante a instante!

Do teu amor espezinhado,
Sonho sereno e malfadado,
           A chama existe
Sob teu peito puro e leal
Unida às rosas do ideal,
Ideal de amor profundo e triste!

Se à tarde chegas à janela
Pálida e triste, pálida e bela,
           Meiga senhora,
Trazes-me e à idéia – cativa rola,
Presa num ramo, flor que se estiola,
Anjo doente, anjo que chora!

Se nesse olhar que o teu procura
Tua alma vais, serena e pura,
           Deixa pousar,
Toda suspensa, trêmula toda,
Nessa ventura que te põe douda
Que te faz quase delirar,

Ai, como pagas essa ventura
Por longos tragos de amargura,
           Noites de dor!
O olhar materno – frio e profundo,
Mostra-te a "Vida", mostra-te o "Mundo"
E amaldiçoa o teu amor!

Eu muita vez penso que Deus
A casta auréola dos anjos seus
          Fez desse pranto,
Fez dessa mágoa, fez dessa Dor,
Do sofrimento pelo amor
Que é dentre todos o mais santo.

Por cada lágrima que desce
Dos olhos teus, sobe uma prece
          Para Jesus,
Prece sentida, prece magoada,
Que a Virgem toma ajoelhada
Para depô-la aos pés da Cruz.

             *  *  *


          ÍNTIMA

Não sei que calma flutua
        Em teu olhar,
Tão pura e tão poderosa,
Sagrada, misteriosa,
Tal como a calma da luz,
Ou como a calma do mar.

Muita vez minh'alma em pranto,
        Amargurada,
Como uma corça ferida,
Procura a fonte da vida
Na harmonia do teu canto,
Na unção da tua risada.

 Pareces-me um ser aéreo,
        Silfo ou anjo,
Que avistando a tua imagem
Pára o vento na ramagem...
Cerca-te um fluido, um mistério.
E é sagrado quanto abranjo!

E este amor ardente e puro
        Que me inspiras
Tem tal força, tal encanto.
Tem tal poder, é tão santo,
Que em seu segredo, obscuro,
Tem o clarão de mil piras.
Basta ver-te, e o meu olhar,
        Morto e vago.
Brilha, lampeja, se inflama,
Tem fulgor de viva chama
Como um sol a incendiar
A quietude de um lago.

Ah! como eu te adoro! santa!
        Meu clarão!
É tão profundo este amor
Como a Saudade e a Dor!
És a flor que se levanta
Das ruínas de um Coração.

              *  *  *


        INVERNO

                          A Lopes Filho


Chega o inverno ríspido;
      O inverno chega, frio:
      Já pelo ambiente gélido
      A névoa fio a fio
              Desce.

O rio, cavo,
        Murmura, ameaça,
               Cresce
        Cresce, transborda e passa.

Aves com frio,
       Ninhos molhados...
       Do rio
As lavandeiras brados
       Soltam com frio.

E o inverno: chega,
Das nuvens desce;
Ruge, estortega,
E o rio cresce,
E as aves choram...
De luto as pedras
Vestem-se, e oram.

As rolas fogem:
Quem sabe aonde
        Elas irão?
Se a névoa esconde
        Os horizontes
Prados e montes
        Acharão?

Pelas campinas,
Pelos oiteiros,
Só nevoeiros,
Frio e neblinas.

Pela cidade
Tristeza só!
Vestem-se os muros
Pardos, escuros,
De limo e pó.

Do campanário
Na flecha esguia,
As andorinhas
À luz do dia
Não pousam mais.
E o grito terno
Delas no inverno
Não se ouve mais!

E eu? Olha, pensa,
Ó meu amor!
Sem fé, sem crença,
Na noite imensa,
Fria, que horror!

Sei que não voltas
      Ao coração...
Não voltas, não!
E as ondas frias
Do bravo mar
Da minha vida,
Com o teu olhar
Só tu podias
Fazer parar!

Noites, que noites!
Estas que passo
Chorando, a orar!
Sem um afago,
Pois na minh'alma
É vago, vago
O teu lugar!

       *  *  *



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